A tradução de Ficino

“A tradução de Ficino do Corpus Hermeticum do grego para o latım foi paradigmática, não apenas porque, depois de alguns séculos, o Ocidente retomava o contato com uma versão mais completa do conjunto de textos herméticos, mas porque essa obra foi um dos pilares de parte importante do pensamento humanista dos séculos XV e XVI. Como des- dobramento disso, a relação de figuras importantissimas do movimento renascentista com a magia teve um elemento-chave no hermetismo. A paradigmática obra da historiadora Frances Amelia Yates mostrou isso a partir da reflexão sobre a importância do hermetismo para a configuração do pensamento de Giordano Bruno. Ainda que Yates tenha carregado nas tintas em sua argumentação, é inegável que elementos brunianos, como a sua teoria heliocêntrica, dialogam com uma leitura hermetista do cosmo.

(…) É possível identificar no pensamento de Isaac Newton diálogos com os Hermetica, por exemplo. O dândi, flaneur e pai do simbolismo, o francês Charles Baudelaire, recebia assim seu leitor em sua emblemática Les fleurs du Mal.”

TRISMEGISTOS, Hermes. Corpus Hermeticum graecum, São Paulo:Ed. Cultrix, 2023, Pág.12-13.

Prefácio

O Corpus Hermeticum

“Provavelmente fruto do caldeirão criado pelas diversas religiosidades iniciáticas experienciadas na região do Mediterrâneo ao longo do século II E.C., O Corpus Hermeticum se arroga uma origem que remontaria aos primordios de uma religiosidade egípcia. A mensagem hermética deixou suas marcas já nos chamados Padres da Igreja, aqueles autores fundamentais para a construção dos pilares do cristianismo latino.”

TRISMEGISTOS, Hermes. Corpus Hermeticum graecum, São Paulo:Ed. Cultrix, 2023, Pág. 11.

Prefácio

Alegria nas redes sociais

“A “alegria” que se encontra nas redes sociais de relacionamento tem sobretudo a função de elevar o sentimento próprio narcísico. Ela forma uma massa de aplausos que dá atenção ao ego exposto ao modo de uma mercadoria.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 767.

Anexos: Sociedade do Esgotamento

A palavra crítica (texto completo)

A palavra crítica vem do grego e possui très sentidos principais: 1) “capacidade para julgar, discernir e decidir corretamente 2) “exame racional de todas as coisas sem preconceito e sem pré-julgamento”; 3) “atividade de examinar e avaliar detalhadamente uma ideia, um valor, um costume, um comportamento, uma obra artística ou científica. A atitude filosófica é uma atitude “crítica” porque preenche esses três significados da noção de crítica, a qual,como se observa, é inseparável da noção de racional, que vimos anteriormente.

A filosofia começa dizendo “não” às crenças e aos preconceitos do dia a dia para que possam ser avaliados racional e criticamente, admitindo que não sabemos o que imaginávamos saber. Ou, como dizia Sócrates, começamos a buscar o conhecimento quando somos capazes de dizer: “Só sei que nada sei”.

Para Platão, o discípulo de Sócrates, a filosofia começa com a admiração ou, como escreve seu discípulo Aristóteles, a filosofia começa com o espanto… “….pois os homens começam e começaram sempre a filosofar movidos pelo espanto (…). Aquele que se coloca uma dificuldade e se espanta, reconhece sua própria ignorância. (…) De sorte que, se filosofaram, foi para fugir da ignorância”.

Admiração e espanto significam que reconhecemos nossa ignorância e exatamente por isso podemos superá-la. Nós nos espantamos quando, por meio de nosso pensamento, tomamos distância do nosso mundo costumeiro, olhando-o como se nunca o tivéssemos visto antes, como se não tivéssemos tido família, amigos, professores, livros e outros meios de comunicação que nos tivessem dito o que o mundo é; como se estivéssemos acabando de nascer para o mundo e para nós mesmos e precisássemos perguntar o que é, por que é e como é o mundo, e precisássemos perguntar também o que somos, por que somos e como somos.

A filosofia inicia sua investigação num momento muito preciso: naquele instante em que abandonamos nossas certezas cotidianas e não dispomos de nada para substituí-las ou para preencher a lacuna deixada por elas. Em outras palavras, a filosofia se interessa por aquele instante em que a realidade natural (o mundo das coisas) e a realidade histórico-social (o mundo dos homens) tornam-se estranhas, espantosas, incompreensíveis e enigmáticas, quando as opiniões estabelecidas disponíveis já não nos podem satisfazer. Ou seja, a filosofia volta-se preferencialmente para os momentos de crise no pensamento, na linguagem na ação, pois é nesses momentos críticos que se manifesta mais claramente a exigência de fundamentação das ideias, dos discursos e das práticas.

Assim como cada um de nós, quando possui desejo de saber, vai em direção à atitude filosófica ao perceber contradições, incoerências, ambiguidades ou incompatibilidades entre nossas crenças cotidianas, assim também a filosofia tem especial interesse pelos momentos de crise ou momentos críticos, quando sistemas religiosos, éticos, políticos, científicos e artísticos estabelecidos se envolvem em contradições internas ou contradizem-se uns aos outros e buscam transformações e mudanças cujo sentido ainda não está claro e precisa ser compreendido.”

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14º Edição. São Paulo: Editora Ática. 2020, pág. 22.

Introdução: Para que filosofia?

Atitude Crítica

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Apresentação

“(…) despertar o interesse pela filosofia partindo de indagações e de problemas suscitados pela experiência cotidiana, ou seja, indicando que as questões filosóficas não são estranhas nem distantes de nossa vida de todo dia; (….) as ideias filosóficas, científicas, religiosas, artísticas, morais e políticas são deter­ minadas pelas condições históricas em que aparecem e se transformam. (…)”

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14º Edição. São Paulo: Editora Ática. 2020, pág. 03.

Apresentação

Aula Magna

O mais útil de todos os saberes

“Platão definia a filosofia como um saber verdadeiro que deve ser usado em benefício dos seres humanos para que vivam numa sociedade justa e feliz“. 

Descartes dizia que a filosofia “é o estudo da sabedoria, conhecimento perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar para o uso da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas e das artes com as quais ficam menos submetidos às forças naturais, às intempéries e aos cataclismos. 

Kant afirmou que a filosofia “é o conhecimento que a razão adquire de si mesma para saber o que pode conhecer, o que pode fazer e o que pode esperar, tendo como finalidade a felicidade humana”. 

Marx declarou que a filosofia havia passado muito tempo apenas contemplando o mundo e que se tratava, agora, de conhecêlo para transformálo, transformação que traria justiça, abundância e felicidade para todos. 

Merleau-Ponty escreveu que a filosofia “é um despertar para ver e mudar nosso mundo”.

Espinosa afirmou que a filosofia “é um caminho árduo e difícil, mas que pode ser per­corrido por todos, se desejarem a liberdade e a felicidade”. 

Qual seria, então, a utilidade da filosofia? 

Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se dei­xar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para ser conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes.” 

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14º Edição. São Paulo: Editora Ática. 2020, pág. 29.

Introdução: Para que filosofia?

Inútil? Útil?

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Análise, reflexão e crítica

“A atividade filosófica é, portanto, uma análise (das condições e princípios do saber e da ação, isto é, dos conhecimentos, da ciência da religião, da arte, da moral, da política e da história), uma reflexão (volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se como capacidade para o conhecimento, a linguagem, o sentimento e a ação) e uma crítica (avaliação racional para discernir entre a verdade e a ilusão, a liberdade e a servidão, investigando as causas e condições das ilusões e dos preconceitos individuais e coletivos, das ilusões e dos enganos das teorias e práticas científicas, políticas e artísticas, dos preconceitos religiosos e sociais, da presença e difusão de formas de irracionalidade contrárias ao exercício do pensamento, da linguagem e da liberdade).

Essas três atividades (análise, reflexão e crítica) estão orientadas pela elaboração filosófica de ideias gerais sobre a realidade e os seres humanos. Portanto, para que essas três atividades se realizem, é preciso que a filosofia se defina como busca do fundamento (princípios, causas e condições) e do sentido (significação e finalidade) da realidade em suas múltiplas formas, indagando o que essas formas de realidade são, como são e por que são, e procurando as causas que as fazem existir, permanecer, mudar e desaparecer.”

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14º Edição. São Paulo: Editora Ática. 2020, pág. 28.

Introdução: Para que filosofia?

Em busca de uma definição da filosofia

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Em busca de uma definição da filosofia

Visão de mundo de um e povo, de uma civilização ou de uma cultura. 

Nessa definição, a filosofia corresponderia, de modo vago e geral  ao conjunto de ideias, valores e práticas pelos quais uma sociedade apreende e compreende o mundo e a si mesma, definindo para si o tem o e o espaço, o sagrado e o profano, o bom e o mau, o justo e o injusto, o belo e o feio, o verdadeiro e o falso o possível e o  impossível, o contingente e o necessário.

Sabedoria de vida. 

Nessa definição, a filosofia é identificada com a atividade de algumas pessoas que pensam sobre a vida moral, dedicando-se à contemplação do mundo e dos outros seres humanos para aprender e ensinar a controlar seus desejos, sentimentos e impulsos e a dirigir a própria vida de modo ético e sábio. A filosofia seria uma escola de vida ou uma arte do bem-viver; seria uma contemplação do mundo e dos homens para nos conduzir a uma vida justa, sábia e feliz (…)

Fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. 

Fundamento é uma palavra que vem do latim e significa “uma base sólida”ou “o alicerce sobre o qual se pode construir com segurança”. Do ponto de vista do conheci­mento, significa a base ou o princípio racional que sustenta uma demonstração verda­deira“. Sob esta perspectiva, fundamentar significa encontrar, definir e estabelecer ra­cionalmente os princípios,as causas e condições que determinam a existência,a forma e os comportamentos de alguma coisa, bem como as leis ou regras de suas mudanças”. 

Teoria vem do grego, no qual significava “contemplar uma verdade com os olhos do espírito, isto é, uma atividade puramente intelectual de conhecimento. Sob esta perspectiva, uma fundamentação teórica significa determinar pelo pensamento, de maneira lógica, metódica, organizada e sistemática o conjunto de princípios, causas e condições de alguma coisa (de sua existência, de seu comportamento, de seu sentido e de suas mudanças)”. 

(…) crítica também é uma palavra grega, que significa a capaci­dade para julgar, discernir e decidir corretamente;o exame racional de todas as coisas sem preconceito e sem pré-julgamentoe a atividade de examinar e avaliar detalhadamente uma ideia, um valor, um costume, um comportamento, uma obra artística ou científica”.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14º Edição. São Paulo: Editora Ática. 2020, pág. 26-27.

Introdução: Para que filosofia?

Em busca de uma definição da filosofia

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