“Nessa época, minha imagem do mundo sofreu uma rotação de 90 graus. Reconheci um caminho que me conduzia irremediavelmente para o exterior, rumo às limitações e obscuridade da tridimensionalidade. Parecia-me que outrora Adão abandonara da mesma forma o paraíso: este se transformara num espectro e ele deveria encontrar a luz lá, no campo pedregoso que trabalhara com o suor de sua fronte.
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O ser humano vem ao mundo com disposições físicas e espirituais particulares; em primeiro lugar, toma contato com o meio familiar e seu ambiente, com os quais se harmoniza numa certa medida, conforme sua individualidade. Mas o espírito familiar, por seu lado, traz em alto grau a marca do “espírito do tempo” que, enquanto tal, permanece inconsciente para a maioria dos homens.
Ora, as crianças reagem muito menos ao que dizem os adultos do que os influxos imponderáveis da atmosfera circundante. Adaptam-se a esta inconscientemente, o que significa que nascem nelas correlações de natureza compensadora.
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Se bem que tenhamos como homens nossa vida pessoal, nem por isso deixamos de ser, em larga medida, os representantes, as vítimas e os promotores de um espírito coletivo, cuja duração pode ser calculada em séculos. Podemos pensar durante toda a vida que seguimos nossas próprias ideias, sem descobrir que fomos os comparsas essenciais no palco do teatro universal. Pois há fatos que ignoramos e que entretanto influenciam poderosamente nossa vida por serem inconscientes.”
JUNG, Carl Gustav. Memórias, sonhos, reflexões. Ed. Nova Fronteira, 2019, Local Kindle 1807-1851.
Anos de estudo