Interpretação é satisfatória

“O leitor de espírito crítico dirá: “Tudo bem, mas o que se faz é simplesmente uma troca de um mito pelo outro que pode ser chamado de mito junguiano”. Não há muito o que se responder a isso, a não ser dizer: “Sim, fazemos isso, mas conscientemente; sabemos o que esta- mos fazendo e, sabemos também que daqui a 200 anos alguém lendo nossas interpretações poderá dizer: ‘Não é gozado? Eles traduziram o mito do conto de fada para a psicologia junguiana e pensaram que era só isso e pronto! Mas nós sabemos que…”. E então, essas pessoas trarão uma nova interpretação e a nossa será arrolada entre tantas outras interpretações – uma ilustração de como tal material foi analisado na época. Estamos bastante conscientes dessa possibilidade e de quão relativas são nossas interpretações e de que elas não encerram a verdade última. Contudo, pela mesma razão que antiga- mente os contos de fada e mitos eram contados, nós hoje os interpretamos, ou seja: existe um efeito vivificante que provoca uma reação satisfatória, trazendo paz ao substrato inconsciente instintivo, sendo o mesmo tipo de sensação que os contos de fada provocam quando contados.

Interpretação psicológica é o nosso modo de contar histórias, pois ainda necessitamos delas e ainda aspiramos à renovação que advém da compreensão de imagens arquetípicas. Nós sabemos muito bem que a interpretação é o nosso mito. Nós explicamos X por Y, porque Y corresponde melhor ao nosso espírito atual. Um dia não será mais esse o caso e haverá necessidade de uma explicação Z. Isso nos leva a afirmar que nossas interpretações nunca deverão se apresentar como “Isto é assim”, o que seria uma tapeação. Numa linguagem psicológica pode-se dizer somente que o mito parece representar isso ou aquilo, e então, modernizá-lo sob essa forma. O único critério correto seria perguntar: Essa interpretação é satisfatória? (…) Se minha psique não diz: “Está bem, porém você ainda não respondeu a isso”, eu sei que eu não posso ir mais além. É possível que haja outras revelações na história, mas eu alcancei os meus próprios limites e não posso ir além de mim mesma. Tenho, pois, que descançar, satisfeita, e comer o que posso digerir. Há muito alimento no simbolismo do texto, mas eu ainda não posso digeri-lo psicologicamente.”

 

FRANZ, Marie-Louise von. A interpretação dos contos de fadas. São Paulo: Paulus, 2022, pág. 64-65.

3.Um método de interpretação psicológica

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