A barulhenta sociedade do cansaço é surda

“A barulhenta sociedade do cansaço é surda. A sociedade do porvir poderia, em contrapartida, ser uma sociedade dos escutadores [Zuhörenden] e escutantes [Lauschenden]. É necessária, hoje, uma revolução temporal, que permita que um tempo inteiramente diferente comece. A crise atual do tempo não é a aceleração, mas a totalização do tempo do si. O tempo do outro se furta à lógica do aumento do desempenho e da eficiência, que produz uma pressão por aceleração.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1273.

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Estratégia de dominação

“A estratégia de dominação consiste, hoje, em privatizar o sofrimento, a angústia, e, assim, ocultar sua socialidade; ou seja, impedir a sua socialização, a sua politização. A politização significa a tradução do privado no público. Hoje, se dissolve, antes, o público no privado. A esfera pública se decompõe em espaços privados.

A internet não se manifesta hoje como um espaço do agir comum e comunicativo. Antes, ela se degrada em espaços de exposição do eu, nos quais se promove, antes de tudo, a si mesmo. A internet não é, hoje, senão a câmara de ressonância do si isolado. Nenhuma propaganda escuta.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1249-1254.

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O escutar tem uma dimensão política

“O escutar tem uma dimensão política. Ele é uma ação, participação ativa na existência do outro e também no seu sofrimento. Só ele liga e medeia os seres humanos primeiramente em uma comunidade. Hoje, ouvimos muito, mas desaprendemos cada vez mais a habilidade de escutar outros e de dar escuta à sua fala, ao seu sofrimento. Hoje, cada um está, de algum modo, sozinho consigo, com seus sofrimentos, com suas angústias. O sofrimento é privatizado e individualizado.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1244.

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Comunicação digital

“Eu obtenho informações pela internet e, para isso, não preciso me voltar para um de frente pessoal. Eu não me apresento no espaço público para obter informações ou mercadorias. Antes, deixo que elas venham até mim. A comunicação digital me conecta, mas me isola ao mesmo tempo. Ela aniquila, de fato, a distância, mas a ausência de distância não produz ainda uma proximidade pessoal.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1232.

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Abertura por meio da qual o outro entra

“A ferida é a abertura por meio da qual o outro entra. Ela também é o ouvido que se mantém aberto para o outro. Quem está inteiramente consigo em casa, quem se fecha em casa, não consegue escutar. A casa protege o ego do assalto do outro. A ferida rompe a interioridade doméstica, narcisista. Assim, ela se torna a porta aberta para o outro.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1224.

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A postura responsável do escutador

“A arte da escuta se realiza como uma arte da respiração. O registro hospitaleiro do outro é um inspirar que, todavia, não incorpora o outro, mas sim o acolhe e o protege. O escutador se esvazia. Ele se torna ninguém.

A postura responsável do escutador frente ao outro se expressa como paciência. A passividade da paciência é a primeira máxima do escutar. O escutador se expõe sem reservas ao outro.

O estar-exposto [Ausgesetzheit] é uma outra máxima da ética do escutar. Apenas ela impede que se curta a si mesmo. O ego não consegue escutar. O espaço do escutar como espaço de ressonância do outro se abre onde o ego é suspenso. No lugar do ego narcisista entra uma obsessão pelo outro, um desejo pelo outro.

“Deixe todos falarem: você não fala; suas palavras tomam das pessoas a sua figura. A sua admiração apaga suas fronteiras; elas não se conhecem mais, se você fala; elas são você”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1205-1218.

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O escutar não é um ato passivo

“No futuro haverá possivelmente, uma profissão que se chamará escutador [Zuhörer]. Em troca de pagamento se fornecerá, ao outro, a escuta. Vai-se ao escutador pois, caso contrário, mal haverá outra pessoa que escutará o outro. Hoje, perdemos cada vez mais a capacidade de escuta. Sobretudo o foco crescente.”

O escutar não é um ato passivo. Uma atividade especial o caracteriza. Eu tenho, primeiramente, de dar boas-vindas ao outro; ou seja, afirmar o outro em sua alteridade. Então, eu o presenteio com a escuta. O escutar é um presentear, um dar, um dom. Só ele traz o outro primeiramente à fala. Ele não segue passivamente o discurso do outro. Em certo sentido, o escutar antecede a fala. Só o escutar traz o outro à fala. Eu já escuto antes que o outro fale, ou eu escuto para que o outro fale. O escutar convida o outro a falar, liberta-o em sua alteridade. O escutador é um espaço de ressonância no qual o outro fala livremente. Assim, o escutar pode ser curativo.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1177-1181.

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Cansaço originário

“O “cansaço originário” (lassitude primordiale) caracteriza uma passividade radical que se furta a toda iniciativa do eu. Ela introduz o tempo do outro. O cansaço primordial abre espaço inacessível a todo poder, a toda iniciativa. Eu sou fraco em vista do outro. Justo nessa fraqueza metafisica do não poder/poder desperta um desejo pelo outro. Mesmo se o sujeito satisfez todas as [suas] necessidades, ele está em busca do outro.

Só o Eros tem condição de libertar o eu da depressão, do envolvimento narcisista consigo mesmo. O outro é, visto assim, uma fórmula de redenção. Apenas o Eros que me arranca para fora de mim e para o outro pode vencer a depressão. O sujeito depressivo de desempenho é inteiramente desacoplado do outro. O desejo do outro, sim o clamor pelo outro ou a “conversão” para o outro  seriam um antidepressivo metafísico, que rompem a casca narcisista do eu.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 1125-1131.

O pensamento do outro