“Procurou o seu último namorado em W., aprontou uma cena lenta, mas acabou reconciliando-se com ele. Arrumou um emprego de doméstica em Schaffhausen, ficando catorze dias apenas, depois Nois dias em Berna, algumas semanas em Zurique e, novamente, um més em Berna, pouco tempo em Zurique, dois meses como enfermeira num manicomio e alguns dias em W. onde gastou suas economias num hotel e brigou com o namorado. Após pouco tempo, nova reconciliação. Voltou para Zurique e em curto espaço de tempo brigou duas vezes com o namorado, assumiu outro emprego por dois meses. viajou então para Chur “por simples distração”, de lá voltando para W., para aprontar outra cena ao namorado; veio novamente a Zurique por alguns dias e logo depois a W. para aprontar uma segunda e última cena ao seu namorado. Depois assumiu o posto de babá em Wallis, ficando dois meses e meio. Adoeceu novamente de úlcera no estómago e voltou para Zurique via W. Ao descer em W., encontrou logo o namorado. Isto a irritou de tal forma que tomou imediatamente o trem de volta a Zurique. Mas ao chegar a Zurique arrepen deu-se de sua decisão e tomou outra vez o trem para W. Chegando à estação de W., arrependeu-se também dessa decisão e voltou de novo Zurique. (A distância de Zurique a W. é de uma hora e meia de trem.) Ao voltar de uma daquelas brigas em W., foi passar a noite num hotel com um estranho que a encontrara na estação de Zurique. Com outro manteve uma conversa erótica e parece tê-lo acompanha. do até o WC, provocando escândalo público.
Em todos os lugares onde trabalhou, o pessoal gostava dela porque estava sempre em ação e era de convivência agradável. Nunca estava quieta, sempre ocupada e agitada. Ultimamente sua agita ção havia aumentado visivelmente, também falava mais do que antes. Nunca fez economias. O que ganhava gastava, e além disso am da contraía dívidas.”
“Por recomendação do professor M., a paciente foi admitida em Burghölzli a 2 de abril de 1903. O relatório clínico enfatiza o seguinte: “A paciente sofre de leve excitação maniaca. Como causa externa deve ser considerado um relacionamento malogrado com um jovem. Por várias semanas a paciente se mostrou expansiva, instável, iritadiça, extremamente generosa, dormia pouco de noite e não va ser contrariada. De humor eufórico, a paciente está muito alegre, loquaz e apresenta leve fuga de ideias. Não pode ser mantida em casa devido à sua expansividade; a todo momento quer fazer outra coisa e quer ir a W. para um ato de vingança contra seu antigo namorado”.”
“Nunca foram observadas depressões ou estados de excitação mais longos, nem mesmo exacerbações do estado normal, com exceção do atual. Ficava algo agitada durante o período menstrual.
No relato desse caso fiz de propósito um levantamento completo das mudanças na posição social para ilustrar a extraordinária instabi lidade e desassossego da paciente. Num período de onze anos mudou de emprego nada menos do que 32 vezes e, na maioria dos casos, porque tinha “enjoado”. Segundo os dados da anamnese, o estado emocional anormal pode ser retraçado até a infância. Além da menstrual, nenhuma outra periodicidade pôde ser constatada. Parece que as depressões nunca surgiram espontaneamente, mas foram provocadas por determinados acontecimentos. O alcoolismo não é mencionado, em vez dele aparece um forte abuso de doces. A constatação de leve fuga de ideias, loquacidade, disposição preponderantemente eufórica, labilidade, distração, compulsão de movimentos e erotismo confirma o diagnóstico de distimia maníaca e explica o modo de vida inconstante e moralmente defeituoso.”
JUNG, C.G. Estudos Psiquiatricos. OC, vol.1. Petrópolis: Vozes. 2013. Pág. 133-135.
Páragrafo 206-210