“Os experimentos de J. B. Rhine em percepção extra-sensorial (PES) na Universidade Duke fascinaram Jung. Estava impressionado porque eles demonstraram, usando a teoria das probabilidades, que a PES não pode ser causalmente explicada. Os experimentos mostraram que os seres humanos podem cruzar as fronteiras aparentemente absolutas que nos limitam a um único contínuo tempo-espaço. Isso lembrou a Jung a teoria da relatividade de Einstein, e também sonhos por ele observados onde imagens de acontecimentos distantes eram formadas durante ou antes deles terem ocorrido. Os experimentos de Rhine ofereceram novas provas empíricas para o que Jung já tinha concluído, a saber, que a psique não está limitada, em absoluto, pelas fronteiras de tempo e espaço. A causalidade, que pressupõe um contínuo tempo-e-espaço rigorosamente fechado, não pode explicar esses eventos. Jung indica que nenhuma energia é transmitida nos experimentos PES de Rhine; há apenas uma “coincidência” no tempo de pensamento e evento. Uma carta do baralho é voltada numa sala, uma imagem aparece na psique de uma pessoa numa outra sala, e as duas imagens coincidem com maior frequência do que é estatisticamente provável. Jung usa o termo “sincronicidade” em letra de forma pela primeira vez neste ensaio: “não se pode falar de causa e efeito, mas de uma coincidência no tempo, uma espécie de simultaneidade. Por causa do caráter dessa simultaneidade, escolhi 0 termo sincronicidade para designar um fator hipotético de explicação equivalente à causalidade.”
“(…)os arquétipos têm, portanto, uma natureza a cujo respeito não se pode afirmar com certeza que seja puramente psíquica” (o grifo é de Jung).
Em capítulos anteriores, sublinhei que OS arquétipos devem ser considerados mais psicoides do que puramente psíquicos. No seguinte trecho, Jung afirma- o de modo explícito: “Embora eu tenha chegado, através de considerações. puramente psicológicas, a duvidar da natureza exclusivamente psíquica dos arquétipos, a própria psicologia viu-se, contudo, obrigada a rever suas premissas ‘unicamente psíquicas’ em face de descobertas também físicas… A identidade relativa ou parcial entre psique e contínuo físico é de suma importância, sob o ponto de vista teórico, porquanto implica uma enorme simplificação ao promover a transposição do aparentemente incomensurável abismo entre o mundo físico e o psíquico, não, por certo, de forma concreta mas, do ponto de vista físico, por meio de postulados empiricamente deduzidos – vale dizer, por meio de arquétipos, cujo conteúdo, se existe, a nossa mente não pode conceber.” Em outras palavras, Jung enxerga vastas áreas de identidade entre as mais profundas configurações da psique (imagens arquetípicas) e os processos e padrões evidentes no mundo físico e estudados por físicos. Assim, de uma forma bastante irônica, resulta que a participation mystique da primeira etapa, a psicologia primitiva, não está, afinal de contas, assim tão longe da realidade! A psique, definida por Jung como quaisquer conteúdos ou percepções que sejam capazes, em princípio, de tornar-se conscientes e ser afetados pela vontade, inclui a consciência do ego, complexos, imagens arquetípicas e representações de instintos. Mas arquétipo e instinto per se deixam de ser psíquicos. Situam-se num contínuo com o mundo físico, o qual, em suas profundidades (como exploradas pela física moderna), é tão misterioso e “espiritual” quanto a psique. Ambos se dissolvem em pura energia. Este ponto é importante porque sugere uma forma de conceber como a psique está relacionada com o soma e com o mundo físico. Os dois domínios, psique e mundo material, podem ser unidos por equações matemáticas e por “postulados empiricamente deduzidos – arquétipos”. Tanto o corpo material quanto a psique não precisam ser derivados um do outro. São, antes, duas realidades paralelas que estão sincronicamente relacionadas e coordenadas.”
Stein, Murray. Jung, O Mapa da Alma – Uma introdução. Ed. Cultrix, 2020, Local Kindle 4901-5205.
9. Do tempo e eternidade (Sincronicidade e Causalidade)