Impulsos primitivos

“Na realidade, não há qualquer «erradicação» do mal. A investigação psicológica em sentido mais estrito, a psicanalítica – mostra antes que a mais profunda essência do homem consiste em impulsos instintivos de natureza elementar, iguais em todos e tendentes à satisfação de certas necessidades primordiais. Estes impulsos instintivos não são em si nem bons nem maus. Classificamo-los, e classificamos as suas manifestações segundo a sua relação com as necessidades e as exigências da comunidade humana. Deve conceder-se que todos os impulsos proibidos pela sociedade por serem maus – tomemos como representação sua os impulsos egoístas e os cruéis – se encontram entre tais impulsos primitivos.

Estes impulsos primitivos percorrem um longo caminho evolutivo até chegarem à manifestação no adulto. São inibidos, dirigidos para outros fins e setores, misturam-se entre si, trocam de objeto e viram-se, em parte, contra a própria pessoa. (…) Estes desenvolvimentos reativos são favorecidos pela circunstância de que algumas moções pulsionais surgem, quase de início, em pares antitéticos, circunstância nota- bilissima e estranha para o conhecimento popular, a que se deu o nome de «ambivalência dos sentimentos».”

FREUD, Sigmund. Porquê a Guerra? – Reflexões sobre o destino do mundo, Ed. Edições 70, 2019, pág.31.

Considerações atuais sobre a guerra e a morte (1915)
“O desapontamento perante a morte”

Vida sagrada

“A uma sociedade que professa a mera vida como sagrada, um ritual como esse pode apenas parecer pura loucura, teatro de crueldade. A sociedade obcecada pela produção não tem acesso ao jogo forte, à morte como intensidade de vida. Numa sociedade arcaica como aquela, se sacrifica mais do que se produz. Sacrificium (sacrifício) significa geração de coisas sagradas. O sagrado pressupõe uma desprodução. A totalização da produção dessacraliza a vida.

A sociedade da produção é dominada pelo medo da morte. O capital opera como uma garantia contra a morte. É imaginado como tempo acumulado, pois com dinheiro se pode pôr outros para trabalhar por si, ou seja, comprar tempo. O capital infinito cria a ilusão de um tempo infinito. O capital trabalha contra a morte como prejuízo absoluto. Ele tem que suprassumir o tempo limitado de vida.”

HAN, Byung-Chul.O desaparecimento dos rituais: Uma topologia do presente. Ed. Vozes, 2021, Local 722-731.

Jogo de Vida e Morte