“1°) Impressões sanguíneas- (…) Os vestígios sanguíneos da Mortalha não são, como as impressões corporais, imagens gráficas. (…) As impressões sanguíneas não são imagens, são decalques; foram formadas com sangue.
(…) Não! um coágulo formado sobre a pele nela se gruda e a mesmo seca.
(…) um coágulo nunca se forma dentro do corpo ou com mais exatidão, nas veias onde o sangue fica sempre líquido.
(…) O sangue (…) continua líquido nos cadáveres, onde fica alojado nas veias por ocasião da morte, as artérias, pelas últimas contrações dos ventrículos e própria elasticidade, vertem-se nos capilares e veias. Nas veias fica líquido por muito tempo, praticamente até a putrefação. E mesmo ali continua vivo durante algumas horas e suscetível de ser transfundido em um homem vivo.
Quando o sangue sai das veias por um ferimento e é recolhido em algum recipiente, pode-se ver como rapidamente se coagula, isto é, se condensa em uma espécie de geleia vermelha que se chama coágulo ou grumo. Este coágulo forma-se pela transformação do fibrinogênio, uma substância dissolvida no sangue, em outra substância sólida, a fibrina, que encerra em suas malhas os glóbulos sanguíneos. (…)A coagulação se produz em tempo muito curto, que não passa de poucos minutos. Depois, o coágulo se retrai e exsuda sua parte líquida, o sérum ou soro. Em seguida, pouco a pouco vai secando.
(…)
Que tenham sido produzidas por sangue líquido, parece muito pouco provável, com talvez uma única exceção: as hemorragias das chagas dos pés, durante o transporte e na estada no túmulo, que escorreram em direção aos calcanhares.
(…)
Alguns coágulos deveriam estar ainda bastante frescos para se conservarem úmidos. Será talvez o caso do grande coágulo anterior da chaga do coração, por causa de sua espessura. (…) A maior parte deste sangue saído pela chaga aberta deve ter caído ao chão, pelo caminho. Só a pequena parte que pôde atingir a pele por entre as pregas daquele pano torcido, e aí aderir por efeito de sua viscosidade, nela coagulou-se em sinuosidades múltiplas, característica do fluxo dorsal. Todos esses coágulos estavam, evidentemente, frescos quando depositaram o corpo sobre a Mortalha; de modo que foram decalcados muito facilmente, com abundância de soro em volta dos decalques.
(…) Convém ainda não perder de vista que o cadáver continuou a exsudar vapor de água por muito tempo. Com frequência se esquece que todas as células do cadáver continuam a viver por conta própria, tanto as da pele como todas as outras, e morrem individualmente, após intervalos diferentes. Se as células nobres, as células nervosas, são as mais frágeis, as outras sobrevivem bastante tempo; a morte total não começa a não ser com a putrefação.*
*Nota Pessoal: Processo de desencarne (cruzar com Ramatís e Kardec)
(…)
“Sobre a Mortalha não há sangue que tenha escorrido; só há coágulos decalcados, que representam a parte do sangue que se coagulou sobre a pele, ao escorrer sobre ela.”
(…) Quando se decalca um coágulo sobre um pano, e, em seguida, se descola, somente uma parte do coágulo permanece fixada sobre o pano, a outra fica sobre o suporte. Haverá, portanto, necessariamente furos e falhas nas imagens dos coágulos sobre o pano. Ora, os que ficaram no Santo Sudário estão perfeitamente intactos, inteiros, reproduzindo a familiar imagem de um coágulo normal.
(…)
Quando imprimi a 1ª edição de “Les Cinq Plaies”, fui à Escola Prática levá-la a meu velho amigo, professor Hovelacque, para que a lesse. Era ele um verdadeiro apaixonado pela anatomia, que ensinava na Faculdade de Paris, mas estava longe de ser um crente. Aprovou com crescente entusiasmo minhas experiências e conclusões. Quando acabou de ler, depositou o opúsculo e, meditando, ficou em silêncio por alguns momentos. Depois, explodindo de repente, com aquela bela franqueza que consolidara nossa amizade, exclamou: “Mas, então, meu velho?… Jesus Cristo ressuscitou!” Raramente em minha vida tive emoções tão profundas e tão doces como a provocada por essa reação de um incrédulo perante um trabalho puramente científico, do qual tirava ele mesmo as incalculáveis consequências.(…)
2°) Impressões corporais- (…) Esta pintura poderia ter sido feita o mais tardar no século XIV, quando reapareceu o Santo Sudário em Lirey. Será necessário repetir mais uma vez todas as impossibilidades que suscita tal hipótese? Esta pintura contém uma imagem negativa, concepção inimaginável até a relativamente recente descoberta da fotografia. (…) suas cópias que, de resto, têm grande semelhança com o original, apresentam em suas chapas fotográficas imagens positivas muito diferentes das do Sudário. Deve-se isto ao fato de que os claros-escuros do Sudário, constituídos negativamente, são de uma perfeição absoluta; e assim pintor algum consegue executá-la como o faz a natureza ou a objetiva fotográfica.”
BARBET, Pierre. A Paixão de Cristo, segundo o cirurgião. São Paulo: Edições Loyola, 2014, pág. 37-45.