“O acaso tem um papel significativo na obra do escultor francês Jean (ou Hans) Arp. Suas gravuras de folhas e outras formas jogadas ao acaso são uma outra expressão da busca, como diz ele, de “um significado secreto e primitivo que dorme sob o mundo das aparencias” Chamou essas composições de Folhas agrupadas segundo as leis do acaso e Quadrados agrupados segundo as leis do acaso. Nessas composições é o acaso que dá profundidade à obra de arte, salientando um principio desconhecido, mas ativo, de sentido de ordem que se manifesta nas coisas como sua “alma secreta”.
Foi acima de tudo o desejo de “tornar o acaso essencial” (segundo Paul Klee) que fundamentou os esforços dos surrealistas de tomar veios da madeira, formações de nuvens etc. como ponto de partida para a sua pintura visionária. Max Ernst, por exemplo, retornou a Leonardo da Vinci, que escreveu um ensaio sobre observações feitas por Botticelli de que, jogando-se uma esponja empapada de tinta numa parede, as manchas resultantes nos fazem ver cabeças, animais, paisagens e uma extensa gama de configurações.
Abaixo, moedas romanas usadas em localidades progressivamente mais distantes de Roma. A face da última moeda (a mais distante do centro de controle) desintegrou-se. Há nesta imagem uma estranha correspondência com a desintegração psíquica que drogas como o LSD podem provocar. Mais abaixo, desenhos de um artista drogado para uma experiência realizada na Alemanha, em 1951. Os desenhos vão se tornando cada vez mais abstratos à medida que o controle do consciente vai sendo vencido pelo inconsciente.
Ernst descreve como foi perseguido por uma visão, no ano de 1925. Ela se impôs verdadeiramente a ele quando fixava um chão ladrilhado e marcado por milhares de ranhuras. “Para dar base às minhas faculdades de meditação e alucinação, fiz uma série de desenhos dos ladrilhos colocando sobre eles, ao acaso, folhas de papel e depois esfregando lápis de cera por cima. Quando olhei o resultado, espantei-me em sentir, de repente, com uma intensa acuidade, a série alucinante de imagens contrastantes e superpostas. Reuni os primeiros resultados obtidos daquelas esfregações (frottages) e chamei-os de História natural.
É importante notarmos que Ernst colocou por cima ou por trás desses frottages um anel ou círculo dando à imagem uma atmosfera e uma profundidade particulares. O psicólogo pode reconhecer aqui o impulso inconsciente de opor ao acaso caótico daquela linguagem natural da imagem um símbolo de totalidade psíquica autossuficiente, estabelecendo assim o equilíbrio. O anel ou círculo domina o quadro. A totalidade psíquica, tendo um sentido próprio e dando um sentido às coisas, rege a natureza.
(…) uma das características da psicose é a consciência e o ego ficarem submersos, “afogados” no fluxo dos conteúdos provenientes das regiões inconscientes da psique.”
JUNG, Carl Gustav. O Homem e seus símbolos. Ed. Harper Collins, 2016, Pág 349-351.
IV O simbolismo nas artes plásticas
Aniela Jaffé