“Nosso texto alquímico é uma mistura de imagens, o que é comum na alquimia. Trata-se de uma combinação de solutio e coniunctio. Sol e Luna estão sendo, a um só tempo, dissolvidos e unidos.
(…) a solutio tem duplo efeito: provoca o desaparecimento de uma forma e o surgimento de uma nova forma regenerada. (…) afirma Filaleto: “O negrume fica, dia após dia, mais pronunciado, até que a substância passa a ter uma brilhante cor negra. Esse negro é um indício de que a dissolução se efetuou.”
O rei e a rainha no banho. (Mylius, Philosophia reformata, Reproduzido em Jung, Psychology and Alchemy.) 1622.
Por conseguinte, a solutio pode tornar-se mortificatio. Isso é compreensível, já que aquilo que está sendo dissolvido experimentará a solutio como uma aniquilação de si mesmo. Aplica-se aqui Heráclito: “Para as almas, é morte tornar-se água. Contudo, a solutio leva ao surgimento de uma nova forma rejuvenescida; quando esse aspecto é acentuado, o tom torna-se positivo. Por exemplo, diz The Golden Treatise Hermes: “Ó, bendita forma aquosa pôntica, que dissolveis os elementos!… Porque quando a composição pelo poder da água é dissolvida, chega o dia da restauração; e então as trevas e a Morte dela se afastam, e a Sabedoria
avança. ”
(…) “afogamento” é sinônimo de solutio.
Solutio do rei. Fundo: o rei, em vias de afogar-se, pedindo socorro, Primeiro plano: o rei renascido. (Trismosin, Splendor Solis, 1582.)
Psicologicamente, o sentido é que o velho princípio dirigente, que passou pela solutio, pede para voltar a ser coagulado numa forma nova e regenerada, afirmando ter ela quantidades de libido (riquezas) a sua disposição.
Outro texto fala de uma hidropisia, um afogamento interior. “O rei pediu um gole de água, dizendo: ‘Peço a água que se acha mais próxima do meu coração, e que me agrada mais do que todas as coisas. Quando o servo lha levou, o rei bebeu tanto que ‘todos os seus membros se encheram e todas as suas veias ficaram inchadas, e ele ficou descolorido’… ‘Estou pesado e minha cabeça dói, e tenho a impressão de que todos os meus membros estão caindo’. Ele pediu para ser colocado num quarto aquecido, onde pudesse suar a água. Mas, pouco depois, quando o quarto foi aberto, ele ali jazia como se estivesse morto. ”
Jung comenta este texto: “O rei personifica a hipertrofia do ego, que pede compensação… Sua sede decorre da sua concupiscência e do seu egoísmo irrefreados. Mas, ao beber, é dominado pela água. ” isto é, pelo inconsciente.
Como sugere Jung, o rei refere-se ao ego pelo menos ao princípio dominante ou regente de acordo com o qual se estrutura o ego. O rei dissolve se em seu próprio excesso alimentar, quer dizer, a inflação é a causa e o agente da solutio. Um ego engolido é dissolvido pelo seu próprio excesso. Sua dissolução enseja um possível rejuvenescimento sobre bases mais sólidas.
Neste caso, o agente da dissolução é o princípio de Eros, Vênus ou Afrodite. A mitologia de Vênus tem importantes relações com a água, uma vez que a deusa nasceu do mar (ver figura 3-4). Seus perigosos poderes de solutio têm como representação sedutoras sereias ou ninfas aquáticas que atraem os homens, levando-os à morte por afogamento.”
EDINGER, Edward F. Anatomia da Psique. O Simbolismo Alquímico na Psicoterapia, Ed. Cultrix 2006, Pág. 71-73.
Capítulo 3 Solutio