Forças criadoras

“[As forças criadoras] te mantêm preso aos cordões e danças de acordo com os movimentos delas, segundo sua melodia. Mas na medida em que dizes que essas forças criadoras existem em Nietzsche, em mim ou em qualquer outro lugar, causas uma inflação, porque o homem não possui poderes criadores, mas é, antes, possuído por eles. Eis a verdade. Se o homem permitir a plena posse por parte deles, sem questionar, sem encará-los, não há inflação; mas, no momento de dissociação, no qual ele pensa “sou o semelhante”, segue-se uma inflação…

Isso ocorre automaticamente: tomas consciência de ti mesmo e desapareces, como se tivesse tocado num fio de alta tensão. Nietzsche, com efeito, não podia deixar de olhar para a coisa, e foi tomado por ressentimentos, porque os poderes criadores roubam o tempo, solapam as forças, e o que resulta disso? Um livro, talvez. Mas onde se acha tua vida pessoal? Tudo se foi. Portanto, essas pessoas se sentem terrivelmente enganadas, ressentem-se, e todos devem ajoelhar-se à sua frente para compensar aquilo que lhes foi roubado por Deus. As forças criadoras tiraram isso delas e por isso elas gostariam de personificá-las, imaginar que são Shiva, a fim de terem o prazer de ser criativas. Mas se sabes que és criativo, mais tarde serás crucificado, porque todo aquele que se identifica com Deus será desmembrado. Um velho padre da igreja, o Bispo Sinésio, disse que o spiritus phantasticus, nosso espírito criador, é capaz de penetrar nas profundezas ou nas alturas do universo, tal como Deus, ou como um grande demônio; mas que, devido a isso, também terá de passar pela divina punição, que tomaria a forma do desmembramento de Dioniso ou da crucifixão de Jesus.

Em geral, o dionisíaco é possesso e extático, promovendo antes a intensidade da experiência do que o significado claro e estruturado. É um solvente dos limites e fronteiras, trazendo vida desmesurada. Em sua forma extrema, é selvagem, irracional, louco, extático, irrefreado. É o inimigo de todas as leis convencionais, normas e formas estabelecidas. Está a serviço da vida e do rejuvenescimento, e não da segurança. O fraco e imaturo pode ser destruído por suas violentas investidas; o saudável será fertilizado e vivificado como a terra pela inundação do Nilo (ver figura 3-11).

Muitas síndromes clínicas têm como causa uma identificação concretista com o princípio dionisíaco. O alcoolismo e o vício das drogas são exemplos evidentes. O donjuanismo também pode ser considerado uma identificação com Dioniso, na qual o indivíduo cria em torno de si uma corte de mulheres em vários estágios de paixão ou de frenesi (Mênades). Essa situação ameaça provocar o próprio desmembramento psicológico desse indivíduo através de conflitos, obrigações e embaraços.

O vinho de Dioniso e o sangue de Cristo são simbolicamente equivalentes. 

 

EDINGER, Edward F. Anatomia da Psique. O Simbolismo Alquímico na Psicoterapia, Ed. Cultrix 2006, Pág. 83-85.

Capítulo 3 Solutio

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