Rituais contém mundo

“Não ocorre depressão em uma sociedade determinada pelo ritual. A alma é totalmente absorvida, esvaziada, pelas formas rituais. Rituais contém mundo. Produzem uma relação forte com o mundo. Na origem da depressão, ao contrário, está uma relação consigo mesmo exageradamente tensa. Nela, se é incapaz de sair de si mesmo, de se ultrapassar em direção ao mundo, e acaba-se encapsulado em si mesmo. O mundo desaparece. Com uma angustiante sensação de vazio, circula-se apenas por si mesmo. Rituais, ao contrário, aliviam o eu do fardo de si mesmo. Eles despsicologizam e desinteriorizam o eu.”

HAN, Byung-Chul.O desaparecimento dos rituais: Uma topologia do presente. Ed. Vozes, 2021, Local 213.

Coação de produção

Depressão como resultado

“A depressão como resultado se apoia, segundo Alain Ehrenberg, na relação perdida com o conflito. A cultura atual do desempenho e da otimização não permite nenhum trabalho sobre o conflito, pois esse trabalho demanda tempo. O sujeito do desempenho atual conhece apenas dois estados: funcionar ou falhar. Nisso ele se assemelha a máquinas. Também máquinas não conhecem nenhum conflito. Ou elas funcionam sem impedimentos ou elas estão quebradas.

Conflitos não são destrutivos. Eles têm um lado construtivo. Só de conflitos surgem relações e identidades estáveis. A pessoa cresce e amadurece por meio do trabalho sobre o conflito.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 399-403.

Terror da autenticidade

Depressão destrutiva

“O tempo no qual havia o outro passou. Desaparece o outro como mistério, o outro como sedução, o outro como Eros, o outro como desejo, o outro como inferno, o outro como dor. A negatividade do outro dá lugar, hoje, à positividade do igual. A proliferação do igual constitui as transformações patológicas que afligem o corpo social. Não privação e proibição, mas sobrecomunicação e sobreconsumo, não repressão e negação, mas permissividade e afirmação o adoecem.Não a repressão, mas a depressão é o patológico sinal dos tempos de hoje. A depressão destrutiva não vem do outro, mas de dentro.

A depressão como pressão interna desenvolve traços agressivos. O sujeito de desempenho depressivo é, por assim dizer, morto à pancada ou sufocado pelo si. Não é apenas a violência do outro que é destrutiva. A expulsão do outro põe em curso um processo de destruição inteiramente diferente; a saber, a autodestruição.

A partir de um determinado ponto, porém, a produção não é mais produtiva, mas destrutiva; a informação não é mais informativa, mas deformadora; a comunicação não é mais comunicativa, mas meramente cumulativa.”

HAN, Byung-Chul.A expulsão do outro: Sociedade, percepção e comunicação hoje. Ed. Vozes, 2022, Local 36-46.

Terror do igual

Liberdade: a contrafigura da coação

“A liberdade é propriamente a contrafigura da coação. Ser livre significa ser livre de coações. Apenas que essa liberdade, que tem de ser o contrário da coação, gera ela própria coações. As enfermidades psíquicas como a depressão ou o burnout são a expressão de uma profunda crise da liberdade. São um sinal patológico de que hoje a liberdade está se transformando em coação. É bem possível que a sociedade antiga fosse bem mais repressiva que a atual. Mas hoje não somos essencialmente livres. A repressão cede lugar à depressão.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 962.

Anexos: Tempo de celebração-a festa numa época sem celebração

Burnout e autoexploração

“O burnout, que em geral precede a depressão, não remete tanto àquele indivíduo soberano, ao qual falta a força para “ser senhor de si mesmo”. O burnout, ao contrário, é a consequência patológica de uma autoexploração. O imperativo da expansão, transformação e do reinventar-se da pessoa, cujo contraponto é a depressão, pressupõe uma oferta de produtos ligados à identidade.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 797.

Anexos: Sociedade do Esgotamento

Depressão e melancolia

“Faz sentido distinguirmos a depressão também da melancolia. A melancolia é precedida por uma experiência de perda. Por isso, ela ainda sempre se encontra numa relação, a saber, numa relação negativa para com o ausente. A depressão, ao contrário, se vê cindida de toda e qualquer relação e “elo de ligação”.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 760.

Anexos: Sociedade do Esgotamento

Sujeito do desempenho pós-moderno

“O sujeito do desempenho pós-moderno, que dispõe de uma quantidade exagerada de opções, não é capaz de estabelecer ligações intensas. Na depressão todas as ligações e relacionamentos se rompem, também a ligação para consigo mesmo.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 757.

Anexos: Sociedade do Esgotamento

O burnout

“O responsável pela depressão, na qual acaba desembocando o burnout, é antes de mais nada a autorrelação sobre-exaltada, sobremodulada, narcisista, que acaba adotando traços depressivos. O sujeito de desempenho esgotado, depressivo está, de certo modo, desgastado consigo mesmo. Está cansado, esgotado de si mesmo, de lutar consigo mesmo. Totalmente incapaz de sair de si, estar lá fora, de confiar no outro, no mundo, fica se remoendo, o que paradoxalmente acaba levando a autoerosão e ao esvaziamento. Desgasta-se correndo numa roda de hamster que gira cada vez mais rápida ao redor de si mesma.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 749.

Anexos: Sociedade do Esgotamento

Depressão simboliza o “incontrolável”

“Segundo Ehrenberg, a depressão simboliza o “incontrolável”, o “irredutível”[44]. Reincide no “conflito das possibilidades ilimitadas com o incontrolável”[45]. Assim, a depressão seria o fracasso frente ao incontrolável, do sujeito que busca iniciativas. Mas o incontrolável, o irredutível ou o desconhecido são, como o inconsciente, figuras da negatividade, que não são constitutivas para a sociedade de desempenho dominada pelo excesso de positividade.”

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. Ed. Vozes, 2022, Local 740.

Anexos: Sociedade do Esgotamento