“Não Deus, mas a demanda pelo infinito é o essencial para a religião – demanda que se preenche na intuição do universo. Escutar é o verbo para a religião, enquanto agir é o verbo para a história. No escutar como inatividade, silencia-se o Eu que é o lugar para decisões e delimitações. O Eu que escuta se mergulha no todo, no ilimitado, no infinito.
“Todo meu ser se silencia e escuta quando as ondas tenras do ar se jogam em meu peito. Perdido no imenso azul, levanto os olhos frequentemente para o éter e os inclino para o mar sagrado […]. Ser um com Tudo, isso é a vida da divindade, esse é o céu do ser humano. Ser um com Tudo que vive, regressar ao sagrado autoesquecimento no Todo da natureza, esse é o ápice dos pensamentos e alegrias, esse é o cume sagrado da montanha, o lugar do repouso eterno.”
Quem se entrega à escuta, perde-se no “todo da natureza”. Quem, em contrapartida, produz-se, põe-se à vista, é incapaz de escutar, de contemplar em uma passividade infantil. Na era da autoprodução permanente e narcisista e da autoencenação, a religião perde seu fundamento, pois a ausência de si é constitutiva da experiência religiosa. A autoprodução é mais danosa à religião do que o ateísmo.”
HAN, Byung-Chul. Vita Contemplativa, ou sobre a inatividade. Ed. Vozes, 2023, Local 1575-1584.
A sociedade que vem