O Enforcado

“Correspondência Astrológica: Netuno.

(…) esse acaba se tornando um significado fundamental do Enforcado parecer, pelo menos, estar de cabeça para baixo ou ao contrário. Em outras palavras, dar aos outros o desejo irresistível de nos transformar por inteiro, para que olhemos, pensemos e ajamos como eles.

Se os outros veem a realidade apenas a partir do que podem tocar ou ver- ou talvez como uma luta entre corpo e alma, e você, por outro lado, percebe a existência como um fluxo constante – ou até mesmo como um romance entre matéria e espírito, então você poderá parecer errado ou deslocado em relação aos demais. Quanto mais você consegue se apegar à sua verdade e não se preocupar com as crenças de outras pessoas sobre elas, mais você descobrirá a serena entrega do Enforcado.

Na Itália, os traidores às vezes eram executados de cabeça para baixo, pendurados pelos pés. Quando o povo italiano se voltou contra Mussolini por empurrá-los a uma guerra desastrosa, uma multidão capturou a ele e a sua esposa e os enforcou de cabeça para baixo. E, de fato, muitos baralhos italianos chamam a carta 12 de Traidor.

(…) a postura relaxada e a expressão serena de sua figura. Encontramos a mesma qualidade em Marselha e na versão Rider, onde o rosto é cercado por um halo de luz.

Se invertermos o número do Enforcado, 12, obtemos 21. Veja o que acontece quando viramos o Enforcado não para o “corrigir”, mas para ver mais claramente sua postura e o colocamos ao lado do Mundo.

(…0o Enforcado se parece tanto com o Mundo porque nos mostra um estágio onde podemos vislumbrar grandes verdades. Com ele, começamos a entender, não apenas o conceito, mas o conhecimento genuino, o que os gregos chamavam de gnose e os cabalistas de Daath. Onde o Mundo dança livremente, fora da realidade comum, de braços abertos, o Enforcado mantém o seu estado de conhecer as coisas e ficar de cabeça para baixo oposto a todos os outros arcanos, ele não está tentando fazer nada. Essa é a razão de seus braços permanecem amarrados atrás das costas na maioria das versões.

A tradição oculta vê os braços do Enforcado como um triângulo, reforçando a ideia da trindade ou tríade, não indicando nenhum trio religioso particular, e a perna cruzada como um possível número quatro, indicando quaternidade. Três e quatro configuram símbolos, respectivamente, para espirito e matéria. Se apenas somarmos os dois números isto é, se adicionarmos conceitos espirituais as práticas materiais – obtemos 7, O Carro, o que pode indicar o controle do eu e das circunstâncias externas da vida. Mas se multiplicarmos três vezes quatro, obtemos 12; portanto, de volta ao Enforcado.

Com A Sacerdotisa, vimos como a Árvore da Vida se escondia atrás de seu corpo, um dos “segredos” da carta. No caso da carta doze, é como se o próprio Enforcado se tornasse a árvore.

Muitos cabalistas descrevem as sefirot como isso, uma árvore que cresce de cabeça para baixo, com suas raízes no céu e seus galhos alcançando a terra. Assim, o Enforcado aparentemente invertido retrata o verdadeiro esta- do da realidade, e o que consideramos normal – naquele tipo de perspectiva que vê a matéria como real e o espírito tão somente como ideia – representa o reverso perfeito da verdade.

Você se lembra de aprender sobre o olho na biologia do ensino médio? A retina recebe as imagens de cabeça para baixo e, em seguida, o cérebro nossas percepções para que possamos nos localizar. Literalmente, nós o mundo inteiro de ponta de cabeça, ou do lado errado.

Na Água, todas as coisas que pareciam fixas e rígidas se dissolvem, incluindo o ego e suas suposições sobre a realidade. “Afogar-se” pode significar ren der-se, libertar-se.

O Enforcado é um arquétipo de iniciação. Considere alguns exemplos. A tradição cristã descreve Pedro como crucificado de cabeça para baixo. A razão segundo a lenda ele não se considerava digno de ser morto como Cristo o foi-parece tão absurda que podemos suspeitar de um significado oculto. Os iogues ficam de cabeça para baixo como forma de movimentar em seu corpo a kundalini. R. J. Stewart, no livro guia de seu Merlin Tarot, conta uma história maravilhosa sobre Merlin prevendo três mortes separadas para a mesma pessoa morte por queda de um lugar alto, morte por enforcamento e morte por afogamento. No climax da história, o jovem cai de um penhasco, fica com o pé preso em galhos e acaba com a cabeça em um rio. Ele morre três vezes, e seu corpo forma o Enforcado além de também formar… o Afogado. Stewart descreve esse processo como uma iniciação, morte seguida de renascimento.

No mito nórdico, Odin, ou Wodan a quem os romanos identificaram com Hermes-Mercúrio se enforca na Árvore do Mundo, chamada Yggdrasil, para receber o alfabeto mágico das runas. Ele perfura um lado do corpo e sacrifica seu olho direito o lado do ego para Mimir, guardião do po- ço escuro onde as runas se escondem. Depois de nove dias e nove noites número do Eremita, e Odin vagucia pelo mundo disfarçado de velho apoiado em um cajado, ele se abaixa e pega as cartas.

Mas vamos ainda mais longe. Um conto no Talmud, com cerca de 2 mil anos de existencia, fala de dois anjos, Shemhazai e Azazel, que desprezam a humanidade por sua constante falha em resistir ás tentações. “Fácil para vocês pensarem assim”, diz Deus a eles. “Se vocês andassem pela terra, fariam o mesmo”. Os anjos riem de tal absurdo.

Então Deus veste os anjos em corpos humanos e os coloca na Terra. Lá, eles encontram mulheres humanas, e imediatamente suas boas intenções desaparecem como fumaça em um vento cortante. Azazel se aproxima da mulher que deseja e, quando ela resiste, ele a violenta.

Shemhazai, no entanto, mantém alguma decência, ou pelo menos orgu- lho. Ele caminha até a mulher que deseja para si e diz a ela: “Durma comigo. Eu sou um anjo”.

A mulher, cujo nome é Istahar, diz: “Ah, sério? Já ouvi essa antes”,

“Não, é verdade”, ele responde, “sou um anjo.”

“Se fosse um anjo, você saberia o nome secreto de Deus.”

“Bem, é claro que eu sei.”

“Então me diga”, arremata a mulher.

Shemhazai ri. “Eu não posso contar a você”, devolve ele. “Você é apenas uma mulher.

“E você é como todos os homens”, diz Istahar. “Fala muito embora não te nha nada a mostrar”.

(…) usando o poder do nome divino para ir ao Céu. Então Deus a transforma em uma estrela.

A poeta Kathryn Good-Schiff afirma que, ingenuamente, acreditamos estar de pe sobre a Terra, mas como a gravidade nos segura pelos pés e nos projetamos para fora do corpo da Terra, é como se estivéssemos penduramos de cabeça para baixo embora, não façamos ideia disso.

Na quinta tríade, O Enforcado fica entre O Hierofante e O Sol. Ele inverte os saberes que temos ao nosso dispor, dos ensinamentos exteriores do Hierofante até a revelação direta do Sol. Ou podemos dizer que ele planta seus pes na doutrina e na tradição e então desce ou cresce na luz da verdade.

O número 12 como o 21, combina o 1 e o 2, respectivamente O Mago e A Sacerdotisa. E ambos podem nos levar ao número 3, A Imperatriz, mãe da vida infinita. A imagem final do Enforcado vem da nossa primeira iniciação: o nascimento. Os bebês emergem do universo fechado dos corpos de suas mães para um mundo aberto e maravilhoso. E eles emergem de cabeça-“coroando”, como também é chamado o nascimento. Nas culturas mais antigas, antes de as mulheres se deitarem em leitos atendidos por médicos, elas se agachavam e os bebés vinham ao mundo de ponta cabeça e amarrados às suas origens por um cordão que partia do centro de seus corpos.”

POLLACK, Rachel.Bíblia Clássica do Tarot, Darkside, 2023, Pág. 185-193.

Gostei e vejo sentido em compartlhar essa ideiA

Facebook
Twitter
Pinterest

QUER MAIS?

Sonho

“SONHO — C.G. Jung: “O sonho é uma porta estreita, dissimulada naquilo que a alma

Leia mais