O Acolhimento dos Hereges

“Tertuliano (…) Lamentava que os hereges acolhessem todos que aderissem a eles, “porque não se importam com seus diferentes tratamentos dos tópicos”, desde que houvesse consenso para acessar “a cidade de uma única verdade”. Contudo, essa metáfora indica que os gnósticos não eram nem relativistas nem céticos.” *(Tertuliano, DE PRAESCR. 7.)

PAGELS, Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 115.

Capítulo: 5- Qual é a “Verdadeira Igreja”?

Não Crie

“A primeira instrução de prática que Rinpoche me deu foi: “Não crie”. Ele me disse: “Deixe sua mente em seu estado natural – não faça nada. Quando pensamentos e sensações surgirem, apenas deixe que surjam. Quando eles se forem, apenas os deixe ir. Não tente manipulá-los“. E depois partiu para o Tibete por seis meses…”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018, p. 148.

Digerir Experiências

“Como digerimos as experiências?

Quando comemos, nós ingerimos, processamos e eliminamos comida. Nossos corpos usam a comida como combustível para a vida e eliminam aquilo que não é mais útil. Seria ótimo poder afirmar que digerimos nossas experiências com a mesma facilidade. Mas há algo a respeito de sermos humanos que faz com que isso não nos aconteça naturalmente. Parece que não conseguimos assimilar a experiência, deixar que ela trabalhe em nós e depois deixá-la ir. Ou nós nos recusamos a ingerir a experiência -e nesse caso nossa vida não nos nutre – ou nos agarramos à experiência até que ela se torne tóxica. A luta que travamos com a experiência nos dá indigestão mental e emocional. Nossa relação com a experiência é sempre de luta contra o mundo-rejeitar o que não é desejado, tentar consertar as coisas e criar estratégias para vivermos à margem da experiência.”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 144-145.

Acolher a Complexidade

“(…) Estou curiosa para saber o que meu pai vai dizer de minha resposta à sua pergunta. Não surpreendentemente, ela me trouxe de volta, mais uma vez, para o Caminho do Meio e para o fascínio que eu tenho pelo poder de uma pergunta aberta. Mas também me inspirou a clarificar o que eu vejo como um equívoco comum: que perderemos nossa clareza e inteligência se desistirmos de nossos pontos de vista mais fortes. Acreditamos que acolher a complexidade irá nos imobilizar. Enquanto escrevo este livro e contemplo a sabedoria do Darma, enquanto escuto e converso com outros e enquanto observo o mundo ao meu redor, fico mais e mais convencida de que acolher a complexidade traz à tona a profundidade, inteligência e compaixão da nossa humanidade.”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 107.

Conclusão Definitiva

“Minha amiga Kelly diz que, quando ouve o noticiário, se depara com tantas informações contraditórias que não consegue chegar verdadeiramente a uma conclusão sobre nada – uma experiência comum. Normalmente vemos isso como um problema. Nossa inabilidade para chegar a conclusões faz com que nos sintamos ignorantes e perdidos. Sentimo- nos pressionados a desvendar aquilo.

Mas pense: experimentar a complexidade talvez nos traga para mais perto da realidade do que pensar que de fato descobrimos como as coisas funcionam. A certeza falsa não finaliza nada. As coisas seguem movendo-se e mudando. Elas são influenciadas por variáveis incontáveis, guinadas e mudanças… nem sequer por um momento descansando em sua coisitude.

Então talvez devêssemos questionar a exatidão e as limitações desse tipo de falsa certeza. Informações conflitantes apenas nos confundem se estamos tentando chegar a uma conclusão definitiva. Mas se já de saída não estivermos tentando a conclusão alguma -se apenas observarmos e prestarmos atenção podemos verdadeiramente ter uma leitura mais plena e precisa do que quer que encontremos.”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 102-103.

Coisas Inconsertáveis

Podemos trabalhar em uma cozinha beneficente, podemos votar, podemos reciclar, podemos adotar animais de rua, assinar petições, levar uma sopa para o vizinho quando ele está doente, oferecer abrigo para aqueles que precisam, derrubar um ditador terrível, expressar amor e cuidado em todas as situações possíveis… e nada poderia a ser mais nobre. Mas isso, ainda assim, não mudará o fato de que o mundo das coisas é fundamentalmente inconsertável.

Mahatma Gandhi, o maior proponente da ação não violenta que o mundo já conheceu, dedicou a vida para trabalhar pela independência indiana do Império Britânico. Seu coração e inteligência o mundo. Mas observe a Índia e o Paquistão desde a independência… ainda estão em conflito. Isso não reflete fracasso da parte de Mahatma Gandhi. Apenas ilustra que o mundo das coisas nunca alcançará um estado de equilíbrio pacifico. Nunca irá nos satisfazer. Nunca matará nossa sede, mesmo por paz.”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 101-102.

Acolhendo Nossa Humanidade

Acomodar tudo”, enquanto prática, significa acolher humanidade em toda a sua glória e confusão. Significa aceitar a beleza, a feiura, a alegria e a dor do mundo – nosso mundo e também todo seu mistério, ambiguidade e contradição. Como viver uma vida com a qual não podemos contar? Como podemos nos deliciar com um pedaço de bolo de chocolate quando uma criança na África tem cólera? Como podemos reconciliar o “eu” e a “iluminação”? Quem pode responder a esse tipo de pergunta? Ninguém pode. O que podemos fazer é acolher seu mistério.

Acomodar tudo é uma prática do coração, uma vez que estamos convidando a vida em vez de rejeitá-la. Essa prática expressa o princípio fundamental da não violência, porque não podemos responsabilizar os outros por nossa felicidade e dor. Não podemos apontar o dedo para o governo e nossa dizer: “É por causa de vocês que minha vida é péssima”. Não podemos objetivar as coisas desse modo quando praticamos. Mas podemos aceitar vida sabendo que cada momento surge em conexão com uma gigantesca e insondável paisagem, da qual somos parte integrante. Somos naturalmente grandes naturalmente infinitos – como todo o resto. ”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 87-88.

Acolhimento

“Uma vez, durante um retiro difícil no qual muitos pensamentos e emoções turbulentas seguiam surgindo em minha prática, meu professor, Dzigar Kongtrul Rinpoche, me explicou que as perturbações que encontrei vinham de uma resistência sutil que eu tinha em relação à minha experiência. Rinpoche me fez recordar que a atitude a ser adotada na prática é a de oferecer respeito e gratidão à mente e à experiência. Quando respondemos a qualquer coisa que surge com julgamento ou agressão, experimentamos a dor disso. Na vez seguinte em que eu sentei para praticar, parei de rejeitar minha experiência, de evitá-la. Surpreendi-me ao ver quanta diferença fazia. Era apenas um pequeno ajuste, mas ainda assim senti como se uma carga enorme houvesse sido liberada.”

MATTIS-NAMGYEL, Elizabeth. O Poder de uma Pergunta Aberta: o caminho do Buda para a liberdade. Teresópolis, RJ: Lúcida Letra,  2018. p. 66.