“(…)A verdadeira gnosis é a que consiste na doutrina dos apóstolos e na antiga constituição [systema] da igreja no mundo inteiro, e o caráter do corpo de Cristo segundo as sucessões dos bispos, pelas quais eles transmitiram às gerações seguintes o que existe em toda parte.” *(Irineu, AH 4.33.8.)
Apenas esse sistema, diz Irineu, constitui o “pilar e a base” dos escritos apostólicos aos quais ele atribui total autoridade – acima de tudo os evangelhos do Novo Testamento. Todos os outros são falsos, duvidosos, não-apostólicos e, provavelmente, elaborados por hereges. Só a Igreja católica oferece um “completo doutrinário”,” proclamando, como vimos, um Deus, criador e pai de Cristo, que encarnou, sofreu, morreu e ressuscitou em sua forma humana. Fora dessa igreja não há salvação: “ela é a entrada da vida; todo o resto são ladrões e marginais.” Como porta-voz da igreja de Deus, Irineu insiste em que aqueles que chama de hereges estão excluídos da igreja. Todos que rejeitam sua versão da verdade cristã são “pessoas falsas, sedutores maléficos e hipócritas”, que “falam para multidões acerca daqueles que pertencem à igreja, os quais denominam de católicos ou eclesiásticos. Irineu diz que deseja “convertê-los para a igreja de Deus” – visto que os considera apóstatas, piores que pagãos.
Os cristãos gnósticos, ao contrário, acreditam que o que distingue o falso do verdadeiro não é a relação com o clero, mas o nível de compreensão de seus membros e a qualidade de sua interação entre si. O Apocalipse de Pedro declara que “os filhos da luz (…) os iluminados distinguem o verdadeiro do falso.”
PAGELS, Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 120.