“Hoje, as imagens mais populares desta carta mostram um jovem, sereno e poderoso, com um sinal do infinito acima de sua cabeça, que aponta sua varinha mágica para os céus como se estivesse invocando a própria energia divina. Na mesa diante dele, estão os quatro emblemas dos Arcanos Menores do tarot, como se ele fosse o mestre do mundo físico e do cosmos natural.
(…) o grande Mago da tradição moderna revela ter suas raízes em alguém que é, na melhor das hipóteses, um artista de rua e, na pior, um vigarista.
O Mago. O ser, a mente, o homem ou Deus, unidade; mãe dos números, a primeira substância.
No mundo divino, o Ser Absoluto que contém e de quem fluem todas as coisas possíveis; no mundo inte- lectual, a Unidade, o principio e a síntese de todos os números, no mundo fisico, o Homem, a mais elevada das criaturas vivas.
O Mago do Poder. (…) sabedoria, adaptabilidade, astúcia, sempre dependendo das cartas ao redor, estando ou não invertida. As vezes, sabedoria oculta. Também prática oculta.
O Mago. Habilidade, diplomacia, sutileza, armadilhas ini migas, o investigador mago, desgraça. se for masculino. Sentido invertido: Médico.
(…)
Todos os primeiros carto mantes supunham que O Mago se referia ao artista de rua, sendo apenas com Éliphas Lévi que seu sentido seria ampliado.
Quando Antoine Court de Gébelin e o Conde de Mellet anunciaram o tarot como um livro de ensinamentos egípcios antigos em 1781, eles estavam se referindo à cidade helenistica de Alexandria, nomeada em homenagem a Alexandre, o Grande, e na qual as ideias e imagens gregas encontraram as egipcias. As tradições esotéricas que surgiram nessa época o periodo anterior ao Império Romano foram atribuidas ao deus egipcio Thoth, uma divindade associada à escrita, à magia, à res surreição dos mortos e à sabedoria de todos os tipos e origens.
Os alexandrinos eram gregos tanto quanto eram egípcios, e por isso liga- ram Thoth a um deus da Grécia com atributos semelhantes, Hermes, chamando-o de Thoth-Hermes, ou Hermes Trismegisto Hermes Trés Vezes Grande. Hermes Trismegisto era um deus, mas também um grande sábio. sendo associado ao lendário autor de um complexo conjunto de textos sa- grados conhecidos coletivamente como “Hermética”.
Para citar o fao Te Ching mais uma vez: “Do Tao vem a Um”. Em outros termos, é como se a unidade do Mago, carta 1, emergisse – magicamente – do Nada sem for- ma do Louco. O maior ato de magia, nos diz o autor Alan Moore, é fazer algo surgir do nada.
(…) os gregos não visualizavam Hermes como algo remoto, grandioso ou inacessível, como se estivesse sentado em algum trono alto. Em vez disso, Hermes era o deus da sabedoria e do conhecimento que não são a mesma coisa -, e faz sentido que os alexandrinos posteriores vissem Thoth e ele como a mesma divindade. (…) O Mago com sua varinha é o principal símbolo de energia masculina do tarot – além de um ladrão.
Quando Zeus ordena que Hermes faça as pazes com Apolo, o deus lhe presenteia com a lira. No mundo antigo, Apolo era conhecido como o deus da música, pois os sons harmoniosos eram entendidos como a própria essência da razão e do intelecto. Porém, não há beleza em uma harmonia que não esteja acompanhada de inspiração, aquele clarão de luz vindo das profundezas. E assim, mais uma vez, temos O Mago como energia criativa dinâmica. Na sequência do mito, Zeus então pergunta a Hermes o que ele gostaria de governar. Sabendo bem que Apolo governa o grande Oráculo de Delfos, o atrevido Hermes pede para ser encarregado da voz da profecia. Zeus se recusa, mas então Apolo nos informa algo digno de nota. A visão profética pode vir de fora, mas há formas de adivinhação que são mais antigas que a profecia, a das três irmās, as Moiras por exemplo, que eram desde o passado longinquo hábeis em predizer o futuro, isso quando o próprio Apolo ainda estava aprendendo a fazer isso. Foi assim que Hermes tornou-se o deus da prática que domina nosso uso moderno do tarot, a adivinhação.
Nos últimos anos, a adivinhação do tarot tornou-se psicologizada, ou seja, as cartas são vistas como ilustrativas de estados psicológicos ou emocionais. Poderíamos dizer, por exemplo, que O Mago simboliza a energia criativa ou que A Imperatriz representa fortes emoções. (…) Karl Kerényi, um dos grandes estudiosos do século passado de mitologia e cultura grega, des creveu a capacidade de Hermes de olhar para a tartaruga e “ver através de seu estado como animal em direção a seu estado futuro como instrumento musical. Essa qualidade divina, ou mágica, de “ver através das coisas e per ceber seu potencial é exatamente o que acontece em uma leitura de tarot. Deitamos as cartas e, inspirados por suas imagens, vemos além de sua situa ção presente em direção aquilo que provavelmente acontecerá a partir delas.
No simbolismo tradicional do tarot, O Mago representa o princípio masculino ativo, leve, direro, ascendente, tendendo à unidade, ao conscien- o racional- -, enquanto A Sacerdotisa representa o principio feminino te e ao – receptivo, escuro, úmido, descendente, indicando complexidade, inconsciência e intuição.
(…) “positivos” e “negativos”.
A própria imagem do número um seja como o algarismo arábico 1 ou o romano I- sugere o órgão masculino, ereto e potente, assim como a repre sentação romana de dois, II, sugere a entrada no útero feminino, onde nasce uma nova vida.
O tarot usa um sistema simbólico muito antigo no qual imagens de homens e mulheres representam qualidades particulares de ambos os géneros. Ao mesmo tempo, os ensinamentos esotéricos sempre entenderam, mesmo quando a socie dade acreditava em rigidos papéis de gênero, que a verdadeira realização está na integração da energia masculina e da feminina.
Um dos beneficios das leituras do tarot é sua capacidade de nos mostrar quais aspectos de nós mesmos estão ativos em um determinado momento.
O número do Mago, o I em algarismo romano, implica o eu conscien- te, o ego que é a palavra latina para “eu”. Ao mesmo tempo, a magia, incluindo a da adivinhação, é perceptível quando permitimos que a energia do universo adentre nosso âmago para então direcioná-la para a manifesta ção no mundo fora de nós. A capacidade de nos tornarmos uma espécie de portal aberto para a energia mágica da adivinhação ou qualquer outra “magia” é simbolizada pela postura do Mago, sua varinha levantada aos céus e seu dedo apontado ao chão. (…)Quase todas as pessoas criativas dirão que, quando o trabalho está indo bem, é como se não o estivessem fazendo. Antes, como se alguma força ou energia estivesse se movendo através delas. em um fluxo, e elas atuassem como o canal para trazer o trabalho ao mun do fisico. Com nossa ênfase moderna na “propriedade intelectual o que coriosamente corna até mesmo a criatividade um ramo do capitalismo- muitos de nós consideram essas declarações pitorescas ou curiosas. (…)
É provável que povos mais antigos compreendessem a magia da criatividade melhor do que nós, vendo-a como um fluxo de energia simbolizado na própria postura do Mago.
Tente ficar nessa posição. Pegue uma vara, uma caneta ou uma varinha mágica de verdade, e levante-a com uma das mãos enquanto a outra apon- ta para a terra. Observe como o seu peito se abre, fazendo com que respire mais profundamente. Agora, feche os olhos e permita-se sentir a energia se movendo através de você, vindo de cima, do mundo sem forma do espírito, para baixo, ao mundo sólido da matéria. Em uma leitura, O Mago simboliza grandes possibilidades criativas e transformacionais.
O corpo do Mago também simboliza a grande verdade hermética “Como acima, assim abaixo”.
Nossas vidas singelas, que muitas vezes podem parecer aleatórias ou sem sentido, constituem na verdade uma parte orgánica do cosmos.
(…)
O sinal de infinito acima da cabeça do Mago – também conhecido como “lemniscata” – simboliza a verdade de que a vida é eterna, não tendo nem começo nem fim, de que nada é verdadeiramente destruído, mas apenas modificado em sua forma. “A energia não é nem criada nem destruída” diz a lei fisica da conservação de energia. (…) Paul Foster Case, em seu livro The Tarot (O Tarot), diz que a tradição oculta atribui o número oito a Hermes Trismegisto, o transmissor dos ensinamentos divinos.
Geralmente, em uma leitura, o Mago significa consciência, vontade e poder transformador ou criativo. Sugere que, de alguma forma, a magia está presente em nossas vidas, ou que temos a capacidade de provocar ou produzir uma mudança mágica. (…) isso pode indicar a necessidade de aproveitarmos essa explosão de energia, esse fluxo de entusiasmo. (…) É uma carta muito auspiciosa para um artista, um escritor ou um performer, pois ela simboliza a própria criatividade.
Como carta de número um, ela pode indicar o início de algo – e um começo muito positivo -, em particular os primeiros passos concretos para tornar esse início algo real e a vontade necessária para levá-lo adiante.
Pense na postura do Mago como um para-raios. Se permitir que a energia passe por ele e seja concretizada em ação, decisão ou obra, experimentará um mágico deleite. Por outro lado, caso resista a fazer isso, a energia ficará represada em seu interior, prejudicando seu próprio sistema.”
POLLACK, Rachel.Bíblia Clássica do Tarot, Darkside, 2023, Pág.63-75.