Unir-se ao Bispo é Unir-se à Igreja

“Como um fiel poderia identificar os verdadeiros e os falsos cristãos? Os cristãos ortodoxos e gnósticos ofereciam respostas diferentes, pois cada grupo tentava definir a igreja de modo a excluir o oponente. Os cristãos gnósticos, pleiteando representar apenas “uns poucos”, sugeriam critérios qualitativos. Em protesto contra a maioria, insistiam em que o batismo não convertia um ser em cristão: segundo o Evangelho de Filipe, muitas pessoas “mergulham na água e retornam à superfície sem terem recebido nada”,  e ainda assim afirmavam ser cristãos. Nem a profissão do credo ou martírio contava como evidência: “qualquer pessoa pode fazer essas coisas.” Acima de tudo, recusavam-se a identificar a igreja com a comunidade visível e real que, diziam, com frequência apenas a imitava. Em vez disso, citando um dito de Jesus (“Pelos seus frutos os conheceremos”), demandavam provas de maturidade espiritual para demonstrar que uma pessoa pertencia à verdadeira igreja.

No entanto, os cristãos ortodoxos no final do século II começaram a estabelecer critérios objetivos para o ingresso na igreja. Quem quer que confessasse o credo, aceitasse o ritual do batismo, participasse na adoração e obedecesse aos clérigos era aceito como um companheiro cristão. Procurando unificar as diversas igrejas espalhadas pelo mundo em uma única rede, os bispos eliminaram os critérios qualitativos para que as pessoas se tornassem membros da igreja. A avaliação de cada candidato com base na maturidade espiritual, percepção ou santidade pessoal, como os gnósticos preconizavam, necessitaria de uma administração muito mais complexa. Além disso, tenderia a excluir muitos que precisavam do acolhimento da igreja. A fim de tornar-se verdadeiramente católica-universal, a igreja rejeitou todas as formas de elitismo, com o intuito de atrair mais e mais fiéis. Nesse processo, seus líderes criaram uma estrutura clara e simples, consistindo em doutrina, ritual e organização política, que provou ser, surpreendentemente, um sistema organizacional muito eficaz.

Assim Inácio, o bispo ortodoxo de Antioquía, define a igreja em termos do bispado que representa esse sistema:

Ninguém que pertença à igreja permanecerá excluido do bispado. A eucaristia será válida quando celebrada pelo bispo ou por quem ele indicat (Qualquer que seja a oferenda do bispo [a eucaristia], acongregação deverá estar presente, assim como em qualquer lugar onde Jesus Cristo esteja, a Igreja católica estará presente *(Inácio, Smyrneans8.1-2.)

(…) Inácio declara:

É ilegítimo batizar ou realizar um ágape (rito eucarístico) sem o bispo (…) Unir-se ao bispo é unir-se à igreja; separar-se do bispado significa não apenas separar-se da igreja, mas do próprio Deus. *(Ibid., 8.2.)

PAGELS, Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 118-119.

Capítulo: 5- Qual é a “Verdadeira Igreja”?

O Jesus Humano

“Por fim, nessa descrição da vida de Cristo e de sua paixão, o ensinamento ortodoxo oferece meios de interpretar elementos fundamentais da experiência humana. Ao rejeitar a visão gnóstica de que Jesus era um ser espiritual, a ortodoxia insiste em que ele, como o resto da humanidade, nasceu, viveu com uma família, sentiu fome e cansaço, comeu e bebeu vinho, sofreu e morreu. Reiteram ainda que ele ressuscitou como um ser corpóreo. Aqui, mais uma vez, como vimos, a tradição ortodoxa implicitamente afirma que a experiência da materialidade do ser é o fato central da vida humana. O que fazemos fisicamente – comer e beber, ter vida sexual ou evitá-la, preservar a vida ou renunciar a ela -, todos são elementos vitais para nosso desenvolvimento religioso. Mas os gnósticos que consideram a parte essencial de cada um de nós como o “espírito interno” rejeitam essa experiência física, agradável ou dolorosa, encarando-a como um aturdimento da realidade espiritual- na verdade, uma ilusão. Portanto, não é surpreendente que inúmeras pessoas identifiquem-se mais com os ensinamentos ortodoxos do que com o “espírito incorpóreo” da tradição gnóstica. Não apenas os mártires, mas todos os cristãos que sofreram ao longo de 2 mil anos, que temeram a morte e morreram, sentem sua experiência legitimada na história do Jesus humano.”

PAGELS, Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 115.

Capítulo: 4- A Paixão de Cristo e a Perseguição aos Cristãos.

Getsêmani

“Os atos prosseguem contando que Jesus, antecipando sua prisão, reuniu seus discípulos no Getsêmani na noite antenor:

(…) reuniu todos os seus discípulos e disse: “Antes de entregar-me nas mãos deles, vamos cantar um hino ao Pai e então nos reuniremos a todos aqueles gue existiram antes de [nós].” Então pediu que formássemos um círculo, dando-nos as mãos, e ele ficou no meio de nós… * (Ibid, 94, em NT APOCRYPHA II, 227)

(…) “Ao dançarino pertence o Universo.” – “Amém.” “Aquele que não dança desconhece o que se passa.” – “Amém.” (…)
“Agora, se vocês seguirem minha dança, verão a si mesmos em Mim que lhes falo (…)

* (lbid·, 95.16-96.42, em NT APOCRYPHA II, 229-231. Para discussão, ver E. Pagels, “To the Universe Belongs the Dancer”, em Parabola IV.2 (1979), 7-9.)

“Você que dança, reflita no que faço, pois é esta paixão do Homem que irei sofrer. Porque vocês não terão meios de entender seu sofrimento a menos que como Logos eu lhes tenha sido enviado pelo Pai(…) Aprendam a sofrer e assim serão capazes de evitar o
sofrimento.”

João prossegue…

Nesse momento, João, sentado em uma caverna em Getsêmani, subitamente teve uma visão de Jesus, que disse:

“João, para as pessoas (…) estou sendo crucificado e perfurado por pregos (…) e recebendo vinagre fel para beber. Mas estou falando com você e ouça minhas palavras.” *(Ibid, 97, em NT APOCRYPHA II, 232.)

PAGELS, Elaine. Os Evangelhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 83-84.

Capítulo: 4- A Paixão de Cristo e a Perseguição aos Cristãos.

Eu Sou o Conhecimento da Verdade

“Como poderia, po exemplo, um cristão no século II escrever o Livro Secreto de João? Podemos imaginar o autor na situação que atribui a João no início do livro: perturbado por dúvidas, começa a refletir sobre o significado da missão e do destino de Jesus. Durante esse questionamento interior, as respostas podem ocorrer de forma espontânea em sua mente; padrões mutantes de imagens podem aparecer. Quem compreende esse processo, não nos termos da psicologia moderna como atividade da imaginação ou do inconsciente, mas em termos religiosos, pode vivenciar essas formas de comunicação espiritual com Cristo. Ao ver sua própria comunicação com Cristo como continuação do que os discípulos desfrutaram, o autor, quando expõe o “diálogo” em forma literária, consegue lhe dar o papel dos que questionam. Poucos entre seus contemporâneos – exceto os ortodoxos, a quem considera homens de “mentalidade literal”- o acusariam de tê-lo forjado; ao contrário, os títulos desses trabalhos indicam que foram escritos “no espírito de” João, Maria Madalena, Filipe ou Pedro.

O título do Evangelho de Maria sugere que a revelação vem da comunicação direta e íntima com o Salvador. A insinuação de um relacionamento erótico entre Maria Madalena e ele pode indicar uma reivindicação de comunhão mística; em toda a história, os místicos de muitas tradições escolheram metáforas sexuais para descrever suas experiências. Os títulos do Evangelho de Tomé e do Livro de Tomé, o Contendor (atribuído ao “irmão gêmeo” de Jesus) podem sugerir que “você, o leitor, é o irmão gêmeo de Jesus”. Quem compreender esses livros descobrirá, como Tomé, que Jesus é seu “gêmeo”, seu “outro eu” espiritual. As palavras de Jesus a Tomé, então, são dirigidas ao leitor:

Como foi dito que você é meu irmão gêmeo e verdadeiro companheiro, examine a si mesmo para que possa entender quem você é(…) Eu sou o conhecimento da verdade.
Então, enquanto me acompanha, embora não possa compreender (isso), você já tomou conhecimento e será chamado ‘aquele que conhece a si mesmo’. Porque quem não conhece a si mesmo não conhece nada, masaquele que conhece a si mesmo atingiu, ao mesmo tempo,o conheci- mento sobre a profundeza de tudo.”*

*Livro de Tomé, o Contendor 1,38.7-18, em NHL 189.

PAGELS, Elaine. Os Evangélhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 19-20.

Capítulo: 1- A Controvérsia Sobre a Ressurreição de Cristo: Acontecimento Histórico ou Símbolo?

Conhecer os Mistérios

“Mateus conta, também, que quando Jesus falava em público, falava sempre por meio de parábolas; quando os discípulos perguntavam o motivo, respondia: “Porque lhes foi dado conhecer os mistérios [mysteria; literalmente, ‘mistérios’] do reino do céu, mas a eles não.” Segundo os gnósticos, alguns discípulos, seguindo suas instruções, mantiveram em segredo os ensinamentos esotéricos deJesus, que transmitiam apenas de forma privada a determinadas pessoas que tivessem provado ser espiritualmente maduras e, por isso, qualificadas para “iniciação na gnosis” – ou seja, no conhecimento secreto.”

PAGELS, Elaine. Os Evangélhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 15.

Capítulo: 1- A Controvérsia Sobre a Ressurreição de Cristo: Acontecimento Histórico ou Símbolo?

JESUS CRISTO Levantou do Túmulo

“Jesus Cristo levantou do túmulo.” Essa proclamação deu início à igreja cristã. Talvez esse seja o elemento fundamental da fé cristã; e com certeza é o mais radical. Outras religiões celebram ciclos de nascimento e morte: o cristianismo insiste que em um momento histórico único o ciclo foi revertido e um homem morto voltou à vida!

(…)

No entanto, certos cristãos – a quem cham de hereges – discordam. Sem negar a ressurreição, rejeitam a interpretação literal; alguns acham “extremamente revoltante, repugnante e impossível”. Os cristãos gnósticos interpretam a ressurreição de várias maneiras. Quem experimenta a ressurreição, segundo alguns, não se depara com Jesus em carne e osso de volta à vida; ao contrário, encontra Cristo no nível espiritual. Isso pode ocorrer em sonhos, no transe extático, em visões, ou em momentos de iluminação espiritual. Contudo, os ortodoxos condenam todas essas interpretações; Tertuliano declara que quem quer que negue a ressurreição da carne é herege, não cristão.

(…)

Entretanto, outras histórias, diretamente justapostas a essas, sugerem visões diferentes da ressurreição. Lucas e Marcos rela-
tam a aparição de Jesus “de outra forma” – não na forma anterior na Terra – a dois discípulos enquanto caminhavam na estrada para Emaús. Lucas diz que os discípulos, profundamente perturbados com a morte de Jesus, falaram com um estranho por várias horas. Convidaram-no para jantar; e quando ele sentou com eles para abençoar o pão, subitamente reconheceram nele Jesus. Nesse momento, “ele ficou invisível diante deles”. João conta, também, uma história bastante diferente pouco antes da história do “incrédulo Tomé”: Maria Madalena, chorando por Jesus junto ao túmulo, vê um homem a quem toma como jardineiro. Quando ele diz seu nome, ela reconhece a presença de Jesus – porém ele lhe ordena que não o toque.”

PAGELS, Elaine. Os Evangélhos Gnósticos. Editora Objetiva, 1979, pág. 1-4.

Capítulo: 1- A Controvérsia Sobre a Ressurreição de Cristo: Acontecimento Histórico ou Símbolo?

Êxtase Crístico

“Jesus conhecia o processo de descida ao corpo que havia sido necessário para a encarnação terrena de sua alma previamente liberta, e com tal conhecimento e poder ele precisou apenas utilizar os princípios criadores que reverteriam esse processo. Desse modo, pôde rapidamente libertar de novo sua alma das limitações físicas, astrais e causais mediante três esforços definidos, voltando a unificá-la com a onisciência e onipotência do Espírito.

Quando a consciência experimenta a unidade com a Consciência Infinita de Deus no estado de profundo samadhi, enquanto a alma ainda reside no corpo físico (ou na forma astral que envolve o corpo causal após a morte), a transcendente consciência extática retorna de maneira inevitável à sua morada corporal (física ou astral, conforme seja o caso). Do mesmo modo, quando Jesus entrou no estado de mahasamadhi – a ascensão consciente desde o corpo físico que uma alma com realização divina efetua no momento da morte – ele imergiu sua consciência na presença bem-aventurada da Consciência Cósmica do Deus-Pai e de lá retornou à sua forma astral celestial, da qual ainda não se havia desfeito. Ali, em êxtase crístico e aplicando a suprema ciência espiritual da libertação, começou prontamente a desatar os nós de vida e consciência que haviam possibilitado sua encarnação terrena e também dela resultaram.”

YOGANANDA, Paramahansa. A Segunda Vinda de Cristo, A Ressurreição do Cristo Interior. Comentário Revelador dos Ensinamentos Originais de Jesus. Vol. III. Editora Self, 2017, pág. 434.

Estado de Consciência Crística

“São João afirmou: “A todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus”. O plural em “filhos de Deus” demonstra distintamente, a partir dos ensinamentos recebidos de Jesus, que o Filho unigênito não era o corpo de Jesus, mas sim seu estado de Consciência Crística.”

YOGANANDA, Paramahansa. A Segunda Vinda de Cristo, A Ressurreição do Cristo Interior. Comentário Revelador dos Ensinamentos Originais de Jesus. Vol. I. Editora Self, 2017, pág. 19.

O Corpo de Lázaro

“No momento em que Jesus chegou a Betânia, o corpo de Lázaro já havia começado o processo de decomposição, pois era “já de quatro dias”. Por isso várias etapas foram necessárias.

Primeiro Jesus estabeleceu contato com Lázaro no mundo astral, de modo que pudesse chamá-lo de volta.

A seguir; projetando sua própria consciência (divinamente invulnerável) no corpo morto de Lázaro, tomou sobre si – absorveu e neutralizou – a força do karma específico que havia compelido a alma de Lázaro a abandonar o corpo.

Uma vez que o padrão cármico da morte não mais estava atuante nas células corporais, Jesus pôde ordenar à Energia Cósmica, pelo comando de sua vontade unida a Deus, que restabelecesse a viabilidade das células, de maneira a se tornarem outra vez capazes de abrigar uma alma vivente dotada de suas faculdades astrais e causais de vida e consciência.

Por fim, ele convidou a alma de Lázaro a habitar outra vez sua residência corporal renovada – a qual, de fato, Jesus ressuscitou do estado de matéria inerte restituindo-lhe os poderes do conhecimento e ação, mente e energia, que haviam abandonado essa forma física com a partida dos corpos astral e causal.”

YOGANANDA, Paramahansa. A Segunda Vinda de Cristo, A Ressurreição do Cristo Interior. Comentário Revelador dos Ensinamentos Originais de Jesus. Vol. III. Editora Self, 2017, pág. 73-74.

Declaração Sobre os Mandamentos

“A declaração de Jesus sobre os dois maiores mandamentos é narrada nos três evangelhos sinópticos com mínimas variações. Nos evangelhos de São Mateus e São Marcos ela ocorre durante a última semana de Jesus em Jerusalém, pouco antes de sua crucificação; no evangelho de São Lucas, sucede mais cedo.

YOGANANDA, Paramahansa. A Segunda Vinda de Cristo, A Ressurreição do Cristo Interior. Comentário Revelador dos Ensinamentos Originais de Jesus. Vol II. Editora Self, 2017, pág. 499.

Capítulo 53: A observância dos dois maiores mandamentos.