Acalento ao Coração

“A essa altura, Anésia abriu precioso livro de meditações evangélicas, acreditando agir ao acaso, mas o tema, em verdade, foi escolhido por Teonília, que lhe vigiava, bondosa, os movimentos.

Com surpresa, a dona da casa notou que o texto se reportava à necessidade do trabalho e do perdão.

Dócil, correspondendo à influenciação da mentora espiritual, a esposa de Jovino começou a falar sabiamente sobre os impositivos do serviço e da tolerância construtiva, em favor da edificação justa do bem.

A voz dela, fluente e suave, transmitia, sem que ela mesma percebesse, o pensamento de Teonília que, com isso, buscava socorrer-lhe o coração atormentado.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 20.

Últimos Suspiros

“Em estreito aposento, uma senhora, aparentando setenta anos de idade, acusava aflitiva dispnéia.

A pequena Márcia, agitando um leque improvisado, propiciava-lhe ar fresco.

Ao lado da enferma, porém, uma entidade de aspecto desagradável exibia estranha máscara de perturbação e sofrimento, imantando-se a ela e agravando-lhe os tormentos físicos.

Tratava-se de um homem desencarnado, demonstrando no olhar a alienação mental evidente.

(…)

– Temos aqui nossa irmã Elisa, em avançado processo liberatório…Vive as últimas horas no corpo carnal…

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 20.

Tribulação Mental

“A companheira humilhada caiu em pranto silencioso sobre velha poltrona e começou a pensar, articulando frases sem palavras:

– Negócios, negócios… Quanta mentira sobre mentira! Uma nova mulher, isso sim!… Mulher sem coração que não nos vê os problemas… Dívidas, trabalhos, canseiras! Nossa casa hipotecada, nossa velhinha a morrer!… Nossas filhas cedo arremessadas à luta pela própria subsistência!

Enquanto as reflexões dela se faziam audíveis para nós, irradiando-se na sala estreita, vimos de novo a mesma figura de mulher que surgira à frente de Jovino, aparecendo e reaparecendo ao redor da esposa triste, como que a fustigar-lhe o coração com invisíveis estiletes de angústia, porque Anésia acusava agora indefinível mal-estar.

Não via com os olhos a estranha e indesejável visita, no entanto, assinalava-lhe a presença em forma de incoercível tribulação mental.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 19.

De Olhos Vendados

“– De minha parte, não vejo como torturar-me. Creio que a casa está bem provida e não estou dormindo sobre nossos interesses familiares. Meus negócios estão em movimento. Preciso de dinheiro e, por essa razão, não posso perder tempo com beatices e petitórios, endereçados a um Deus que, sem dúvida, deve estar muito satisfeito em morar no Céu, sem lembrar-se deste mundo…

Anésia dispunha-se a revidar, no entanto, a atitude do marido era tão flagrantemente escarnecedora que, decerto, julgou mais oportuno silenciar.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 19.

Para que a Prece?

“Dona Anésia reajustou a copa e a cozinha, operando em silêncio, enquanto o marido se esparramava numa poltrona, devorando os jornais vespertinos. Reparando, todavia, que o esposo se levantara para sair, endereçou-lhe olhar inquieto e indagou, delicadamente:

– Poderemos, acaso, esperar hoje por você?

– Hoje? hoje?… – redarguiu o interlocutor, sem fixá-la.

E o diálogo prosseguiu, animadamente.

– Sim, um pouco mais tarde; faremos nossas preces em conjunto…

– Preces? para que isso?

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 19.

Refazimento Mental

“– Anotemos o caso desta pobre mãe desarvorada.
O filho suicidou-se, há meses, e ainda não consegue forrar-se à flagelação Intima. Em sua devoção afetiva, reclama-lhe a manifestação pessoal sem saber o que pede, porque a chocante posição do rapaz constituir-lhe-ia pavoroso martírio. Não poderá, desse modo, recolher-lhe a palavra direta, entretanto, ao contacto do trabalho espiritual que aqui se processa, incorporará energias novas para refazer-se gradualmente.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 18.

Proteção Magnética

“Esses casos, porém, constituíam exceção, porque em maioria o séquito de irmãos desencarnados se formava de gente agoniada e enferma, tão necessitada de socorro fraterno como os doentes e aflitos que passavam a acompanhar.

Entramos.

Grande mesa, ao centro de vasta sala, encontrava-se rodeada de largo cordão luminoso, de isolamento.

Em derredor, reservava-se ampla área, onde se acomodavam quantos careciam de assistência, encarnados ou não, área essa que se mostrava igualmente protegida por faixas de defesa magnética, sob o cuidado cauteloso de guardas pertencentes à nossa esfera de ação.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, Capítulo 16.

O Todo é Movimento

“Hilário, semi-espantado, considerou:

– O que me assombra é reconhecer o serviço incessante por toda a parte. Na vigília e no sono, na vida e na morte…

Respondeu Áulus, sorrindo:

– Sim, a inércia é simplesmente ilusão e a preguiça é fuga que a Lei pune com as aflições da retaguarda.”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, pp. 125-133.

Socorro Espiritual no Purgatório

“A breve tempo, penetramos nebulosa região, dentro da noite.

Os astros desapareceram a nossos olhos.

Tive a impressão de que o piche gaseificado era o elemento preponderante naquele ambiente.

Em derredor, proliferavam soluços e imprecações, mas a pequenina lâmpada que Abelardo agora empunhava, auxiliando-nos, não nos permitia enxergar senão o trilho estreito que nos cabia percorrer.

Findos alguns minutos de marcha, atingimos uma construção mal iluminada, em que vários enfermos se demoravam, sob a assistência de enfermeiros atenciosos.

Entramos.

Áulus explicou que estávamos ali diante de um hospital de emergência, dos muitos que se estendem nas regiões purgatoriais.

Tudo pobreza, necessidade, sofrimento…”

Xavier, Francisco Cândido / André Luiz. Nos Domínios da Mediunidade. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1955, pp. 125-133.

Espíritos Sofredores, Povos Sofredores

“(Jesus para Ismael)

“Abriga aí, na sagrada extensão dos territórios do país do Evangelho, todos os infortunados e todos os infelizes. No meu coração ecoam as súplicas dolorosas de todos os seres sofredores, que se agrupam nas regiões inferiores dos espaços próximos da Terra. Agasalha-os no solo bendito que recebe as irradiações do símbolo estrelado, alimentando-os com o pão substancioso dos sofrimentos depuradores e das lágrimas que lavam todas as manchas da alma.

Leva a essas coletividades espirituais, sinceramente arrependidas do seu passado obscuro e delituoso, a tua bandeira de paz e de esperança; ensina-lhes a ler os preceitos da minha doutrina, nos códigos dourados do sofrimento.”

Ismael sente que luzes compassivas e misericordiosas lhe visitam o coração e parte com os seus companheiros, em busca dos planos da erraticidade mais próximos da Terra. Aí se encontram antigos batalhadores das cruzadas, senhores feudais da Idade Média, padres e inquisidores, espíritos rebeldes e revoltados, perdidos nos caminhos cheios da treva das suas consciências polutas.”

Xavier, Francisco Cândido / Humberto de Campos. Brasil: Coração do Mundo, Pátria do Evangelho. Federação Espírita Brasileira, Brasília, 1938, pp. 47-48.